"realidade" - desenho de Iris Gomes de Oliveira - 2003
O Museu Mineiro por meio do projeto “Cultura indígena: um olhar diferenciado” levou a mostra “Palavra: dos homens, das coisas, das plantas e dos animais” ao Museu do Crédito Real em Juiz de fora, o primeiro Museu financeiro criado no Brasil e o sexto do mundo.
Ao montar a exposição em um espaço dedicado à preservação da memória monetária e bancária do país, preparamos uma ação educativa que dialogasse com este acervo de cheques, promissórias, relatórios, balancetes, moedas e cédulas confrontando-nos, sobretudo com as questões do dinheiro e da palavra (objeto da exposição), as relações que se estabelecem entre esses dois temas, e ainda, o significado do dinheiro na cultura indígena e na nossa cultura.
Haverá outro tipo de civilização baseada em outros valores que não o dinheiro e o capital?
Há coisas que deveriam ser dadas, mas nunca vendidas?
O mundo é uma mercadoria?
“O dinheiro compra tudo até amor verdadeiro” - provoca o dramaturgo, jornalista, Nelson Rodrigues.
Afinal o dinheiro deve ser um fim ou um meio?
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PALAVRA DO DINHEIRO
"realidade" (detalhe) - desenho de Iris Gomes de Oliveira - 2003
Percorrendo o acervo do Museu do Crédito real podemos ter uma idéia da importância sem precedentes que o dinheiro ganhou em nosso mundo. Afinal o que têm em comum palavras e moedas? O dinheiro representa a prosa da vida?
A palavra e o dinheiro
Como associar em uma ação educativa duas coisas que em princípio têm tão pouco parentesco e, de certa forma, são até antagônicas, na medida em que o dinheiro só expressa o mundo material?
Mark Boyle é um economista irlandês de 29 anos que quer mostrar que os princípios que regem o capitalismo estão errados e que não é necessário gastar nenhuma libra para se viver com dignidade.
Tentou ir a pé e sem dinheiro até a Índia, sem, no entanto, passar de Calais (França), onde as dificuldades para se comunicar com os franceses o fizeram voltar para casa.
Esta “aventura” do jovem economista sucinta a seguinte questão:
Se Boyle dominasse as línguas dos países que iria passar teria conseguido chegar ao seu objetivo?
Afinal o que têm em comum palavras e moedas?
Oscar Pigallo em seu livro “A aventura do dinheiro” afirma que palavras e moedas têm algo em comum: “dependem de consenso e só circulam onde são conhecidas. Uma moeda de valor ignorado é tão inútil quanto uma palavra de sentido obscuro. Moeda e palavra correm o risco de ser desvalorizadas: a primeira pela inflação, a última pelo clichê (de tão usada e repetida desgastou-se, perdeu o sentido). O valor de uma e o sentido da outra não são naturais nem absolutos, mas sociais e relativos decorrentes de um processo de aceitação generalizada pelo uso e costume. De outro modo, teríamos moedas e palavras particulares, o que é uma idéia descabida; se não fazem sentido para a sociedade, simplesmente inexiste, ponto”.
A idéia de que o dinheiro resulta de convenções sociais é tão antiga que está presente na própria etimologia da palavra que significa "moeda cunhada": numisma, que vem do grego nômisma e não por acaso tem a mesma raiz do termo que designa lei, nomos. "O dinheiro tem esse nome porque existe não por natureza, mas pela lei, e porque está em nosso poder mudá-lo ou torná-lo inútil", escreveu Aristóteles em Ética a Nicômacos, livro dedicado ao filho e discípulo. A própria noção do dinheiro pressupõe civilização, premissa cujo inverso também pode ser demonstrado: as civilizações costumam depender da existência de dinheiro, qualquer que seja sua representação. "O dinheiro é uma vasta metáfora social", afirmava o teórico das comunicações Marshall McLuhan, em texto da década de 60. Para esse pensador canadense, ”o dinheiro é a linguagem que permite traduzir o trabalho de um agricultor no de um barbeiro, médico ou encanador, o que reforça os laços de interdependência numa comunidade. Nesse sentido, trata-se de um meio de troca ou de pagamento, definição que, com essa terminologia mais técnica, tem abrigo garantido em qualquer introdução à economia. Mas o dinheiro é mais do que isso“.
Para mudarmos a vida precisamos mudar de vida.
"As sociedades ocidentais jogam fora um terço da comida que consomem. Se as pessoas produzissem seu próprio alimento, teriam muito mais cuidados. O mesmo acontece com a água, se nós é que tivéssemos que mantê-la limpa, não a sujaríamos. O problema verdadeiro é que esta sociedade nos deixou completamente insensíveis sobre o que representa consumir. Não respeitamos em absoluto a energia gasta nas coisas que compramos, portanto não temos nenhum problema em desprezá-las”, diz o irlandês Boyle, que agora tentará outra vez sem dinheiro durante pelo menos um ano, viver em um trailer em Bristol, no Oeste da Inglaterra, com um fogão a lenha, um chuveiro com painel solar, uma bicicleta e um buraco no chão como banheiro espera ter mais sucesso que em sua "aventura" anterior.